Vivemos uma situação de guerra no Pantanal, diz senador de comissão de queimadas

Sem culpar fazendeiros, Fagundes, 63, aponta a inércia do Estado e a falta de políticas públicas como razões da tragédia que atinge a região

© Getty Images

Brasil WELLINGTON-FAGUNDES 14/10/20 POR Folhapress

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Senador em primeiro mandato após 24 anos como deputado federal, Wellington Fagundes (PL-MT) tem visto a cidade em que nasceu, Rondonópolis (MT), arder em chamas.

PUB

 

À frente da comissão do Senado que acompanha os incêndios no Pantanal, o senador, médico veterinário de formação, trabalha para que o Estatuto do Pantanal seja concluído nos próximos meses.

A legislação criará uma certificação para atividades sustentáveis na bacia do rio Paraguai, a fim de mitigar os danos ambientais na produção.

Sem culpar fazendeiros, Fagundes, 63, aponta a inércia do Estado e a falta de políticas públicas como razões da tragédia que atinge a região. Mais de 1/4 do bioma foi consumido pelo fogo neste ano, a maior parte em decorrência de ações humanas como a queima para manejo de pastagem e ampliação a área de plantio, amplificadas por um período de secas especialmente intenso.

PERGUNTA - Como os senhores pretendem trabalhar a questão da pecuária em uma área tão delicada e necessária quanto o Pantanal?

WELLINGTON FAGUNDES - Mais de 90% da área do Pantanal é da iniciativa privada. Portanto, a responsabilidade da conservação do bioma é privada, na experiência centenária do pantaneiro. Não é o boi que precisa do Pantanal, é o Pantanal que precisa do boi. Temos visto uma diminuição do gado no Pantanal.

Mato Grosso do Sul fez uma modificação da lei, e Mato Grosso não. Com isso, temos uma restrição muito grande no Pantanal mato-grossense para fazer limpeza de área, a queima controlada, a formação de novas pastagem para o alimento do gado.

Como essa queima é cíclica, assim como as enchentes, tem de haver muitas chuvas nas cabeceiras para que o Pantanal realmente encha, o que não aconteceu no ano passado. Não tem reserva de água em local nenhum.

P. - Qual sua sensação ao ver tanta destruição?

WF - A gente fica estarrecido. A gente vê a destruição com a tristeza e a revolta. Temos tecnologia suficiente no mundo, temos o Inpe, satélite da Nasa, que já tinham previsão de seca de mais quatro ou cinco anos. E mesmo assim tudo chegou como uma surpresa.

O Estado como um todo não se preparou para isso. Tivemos um depoimento do próprio general [Augusto] Heleno [ministro do Gabinete de Segurança Institucional], que disse que o governo não teve tempo de se preparar e cuidar da Amazônia e do Pantanal.

Para nós aqui causa uma grande impotência. Por isso criamos nossa comissão externa, para chamar a atenção do governo e mostrar quanto tempo isso vai demorar, e ao mesmo tempo propor uma ação legislativa. Tudo com a democracia brasileira é demorado. Para chegar qualquer recurso na ponta é demorado.

E vivemos duas situações aqui, que é a pandemia, porque a Covid está no Pantanal também, e a questão dos incêndios. Vivemos uma situação de guerra no Pantanal. A Defesa Civil já veio, liberou parte dos recursos. Pelo menos temos agora a presença efetiva de Corpo de Bombeiros, de brigadistas e da Marinha.

P. - Se o governo fosse menos negacionista [em relação aos problemas ambientais] teríamos menos problemas no Pantanal?

WF - O Brasil não tem cultura de planejamento. Não temos política de Estado, nossas políticas são de governo, e aí aquilo que está estabelecido às vezes não é tocado para a frente. Cada ministério quer fazer um programa novo, e isso leva a muito desperdício, de esforço físico e econômico.

No nosso caso, não temos uma segurança jurídica que permita o desenvolvimento sócioambiental do sistema, por isso [criar] o Estatuto do Pantanal. Para trazer a segurança jurídica, colocando essa sustentabilidade econômica com a conservação do Pantanal.

P. - O problema do Pantanal são as ocupações?

WF - No Pantanal, só 15% da área está com a presença da ocupação. O problema do Pantanal é o abandono. Falta política pública definida do que fazer e a forma como fazer.

P. - O governo tem citado o clima como responsável pelas queimadas. Como o sr., presidente da comissão, fará para que o governo não se exima da responsabilidade?

WF - Já estamos cobrando participação mais efetiva do governo. E felizmente o governo veio. Tenho de elogiar os trabalhos dos brigadistas, bombeiros, Forças Armadas, especialmente a Marinha.

A característica do Pantanal é a criação de bezerro, não tem subsídio. E o clima mudou drasticamente, a temperatura, está constatado, aumentou. O governo já admitiu isso.

P. - É aceitável que se negue tanto os problemas ambientais do país?

WF - O presidente Bolsonaro faz uma política [ambiental] para fora, especialmente para as nações que querem puxar a orelha do Brasil. A gente já ouviu muito sobre a internacionalização da Amazônia, talvez por ele ser militar. Quando vêm aqui os ministros, essa dúvida não existe. É um caso do presidente.

Nós precisamos de uma política perene, de investimentos. Por isso estamos pedindo uma audiência com o presidente da República, na qual queremos levar um diagnóstico para ele, mas a reivindicação para que o governo possa fazer de imediato um programa emergencial da recuperação do que é hoje.

P. - Qual valor vocês estimam para esse programa?

WF - Vai ter de ser criada uma linha de crédito especifica para reconstrução de cercas, de casas, pois muitos perderam tudo. Não temos ainda o valor levantado. Precisamos limpar o que foi destruído. Assim como foi criado o Pronampe, talvez [precisemos de] um Pronampe do Pantanal.

P. - O Brasil tem passado por uma série de tragédias ambientais nos últimos anos. O Pantanal não corre o risco de ser esquecido?

WF - O Brasil tem memória curta, e o governo tem memória mais curta ainda. Não tem um governo que faça política de Estado. Tanto é que o Brasil é campeão de obras inacabadas.Esse discurso que estamos fazendo há 20, 40 anos foi repetido quase sempre da mesma forma. Por falta de política definida, o Pantanal foi ficando abandonado. As tragédias no Pantanal são resultado do abandono de políticas de governo.

P. - O sr., como aliado do governo, defende a criação do Renda Cidadã?

WF - Esses programas sociais foram fundamentais para garantir a vida dos desempregados e das micro e pequenas empresas, para garantir o dinheiro circulando na base.Se não fosse a pressão do Congresso, essas políticas não existiriam. A política econômica deste governo não tinha esse viés, ele terá de refazer a política econômica, porque o presidente gostou muito dessa linha social. O governo não vai concluir [o mandato] com a mesma linha que entrou.

P. - É impossível a reforma tributária sair neste ano?

WF - Reformas administrativa e tributária, ao mesmo tempo, não se consegue.

P. - O sr. defende a PEC da reeleição no Senado?

WF - Assinei a PEC, no Brasil tem muito de a gente assinar para promover uma discussão. Preferia discutir do que votar no afogadilho. Muitos pedem que não se tenha reeleição, e a Constituição é clara. Discutido em cima da hora, o processo de reeleição parece mais interesse pessoal. Mas, no Executivo, a reeleição tem sido um bom negócio.Wellington Antônio Fagundes, 63

De Rondonópolis (MT), é senador pelo PL. Médico veterinário formado pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), presidiu a Associação Comercial e Industrial de Rondonópolis por dois mandatos, de 1983 a 1986. Em 1990, foi eleito deputado federal, cargo para o qual seria reeleito em 1994, 1998, 2002, 2006 e 2010. Desde 2015, está no Senado.

PARTILHE ESTA NOTÍCIA

RECOMENDADOS

fama Jojo Todynho Há 20 Horas

Jojo Todynho veste roupa que usava antes de perder 50kg. "Saco de batata"

mundo EUA Há 18 Horas

Criança morre após ser forçada a correr em esteira pelo pai

brasil Herança Há 22 Horas

Viúvo de Walewska cobra aluguel para que sogros morem em imóvel da filha

brasil Rio Grande do Sul Há 21 Horas

Governador do RS alerta para "maior desastre da história" do estado

fama Brian McCardie Há 20 Horas

Morre Brian McCardie, ator da série Outlander, aos 59 anos

fama Bastidores da TV Há 12 Horas

Bianca Rinaldi relata agressões de Marlene Mattos: "Humilhação"

brasil MORTE-SC Há 20 Horas

Adolescente de 14 anos morre após ser picado por cobra venenosa em SC

mundo Londres Há 20 Horas

Responsável por ataque com espada em Londres tem cidadania brasileira

fama Isabel Veloso Há 21 Horas

Marido de influencer com câncer terminal: 'Finjo que não vai acontecer'

esporte Arábia Saudita Há 21 Horas

Sem folga: Al Hilal treina após garantir vaga na final; veja as imagens