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CANNES, FRANÇA (FOLHAPRESS) - Com 15% mais filmes concorrendo à Palma de Ouro, duas novas mostras e 30% menos público, o Festival de Cannes encerrou no sábado a sua 74ª edição, confirmando a frase lançada por sua direção na apresentação do evento: "O cinema não morreu".
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Se ainda é cedo para dizer quando e como a vida –e o mercado audiovisual– voltará ao ritmo pré-pandemia, o festival conseguiu comprovar que, mesmo em tempos de Covid-19, é possível reunir 28 mil participantes interessados por fazer, vender, comprar, ver ou resenhar filmes feitos para as telas grandes.
Os concorrentes à Palma de Ouro saltaram de 21 para 24, como consequência do cancelamento do festival no ano passado –diretores como Nanni Moretti, de "Tre Piani", Sean Penn, de "Flag Day", e Wes Anderson, de "A Crônica Francesa", preferiram segurar o lançamento de suas obras por um ano para estrear neste ano em Cannes.
A eles se reuniram cineastas já consagrados, como o iraniano Asghar Farhadi, de "O Herói", crônica crítica sobre um presidiário que vira celebridade da noite para o dia, e Paul Verhoeven, de "Benedetta", sobre o julgamento de uma freira do século 17 por relações lésbicas no convento.
Sem nenhum diretor na competição, a América Latina apareceu como cenário de "Memoria", do tailandês Apichatpong Weerasethakul, uma viagem onírica pelas selvas da Colômbia.
Da Ásia participou também o japonês Ryusuke Hamaguchi, que partiu de dois contos de Haruki Murakami e do teatro de Anton Tchékhov para construir a história de um diretor de teatro e sua motorista, num dos filmes mais elogiados desta edição.
Aplausos não faltaram para Wes Anderson e "A Crônica Francesa", fantasia esplendorosa sobre um suplemento semanal inspirado na revista The New Yorker. O filme explorou como poucos os recursos da narrativa cinematográfica.
Outra estrela americana, o ator e diretor Sean Penn, apresentou "Flag Day", baseado na história real do trapaceiro americano John Vogel, contada pela filha (interpretada por Dylan Penn).
Não apareceu como favorito, mas agradou a ponto de apagar o gosto amargo da última passagem do astro americano por Cannes, em 2016, quando "The Last Face" foi muito mal recebido.Filmes franceses concorrentes apareceram como favoritos de críticos da mídia local: o inclassificável musical "Annette", de Leos Carax, que abriu a edição, "Les Olympiades", de Jacques Audiard, sobre a vida afetiva e sexual da "geração perdida" de jovens franceses. Já a Palma de Ouro foi para "Titane", de Julia Ducournau.
Fantasias, amor e questões identitárias deixaram em segundo plano filmes políticos, como "Ha'berech", do israelense Nadav Lapid, "La Fracture", da francesa Catherine Corsini, e "Casablanca Beats", do franco-marroquino Nabil Ayouch.
O delirante "Petrov's Flu" entrou na categoria política menos pela temática e mais pela ausência de seu diretor, Kirill Sebrennikov, impedido de viajar pelo regime de Putin.
O momento mais combativo aconteceu fora da competição, com a exibição de última hora do documentário "Revolution of Our Times", sobre os protestos em Hong Kong. Até ser exibido em Cannes, a produção estava sob sigilo.
Dirigido por Kiwi Chow, o filme mostra as manifestações que tomaram as ruas de Hong Kong na segunda metade de 2019 e a brutal repressão policial que se seguiu. Com a nova Lei de Segurança Nacional imposta pelo governo chinês em 2020, os participantes do documentário podem ser presos.
Com um orçamento de EUR 20 milhões (cerca de R$ 120 milhões), Cannes projetou 86 longas e 28 curtas em cerca de 20 salas de cinema, algumas com capacidade para mais de 2.300 pessoas, ao longo de 12 dias. É preciso mais tempo para avaliar o impacto, no contágio pelo coronavírus, mas não parece ter havido uma catástrofe sanitária.
Os sustos iniciais, que colocaram o israelense Nadav Lapid em isolamento e impediram a viagem da francesa Léa Seydoux, fizeram a organização reforçar regras de segurança, principalmente no uso de máscara em áreas internas.
O governo não publica dados específicos sobre Cannes, e a grande presença de estrangeiros fará com que eventuais contágios acabem aparecendo nas estatísticas de outros países. No departamento dos Alpes Marítimos, em que fica a cidade, o número de novos casos dobrou na semana que terminou no dia 12, com 152 testes positivos por dia.
Restrições de viagem também impediram a vinda da maior parte dos jornalistas e negociantes latino-americanos e asiáticos, reduzindo as filas e aumentando as chances de conseguir entrevistas com diretores da competição.
O maior impacto aconteceu na área de negócios, onde foram montados 130 estandes, uma queda de 65% em relação à última edição presencial, em 2019. O subsolo do Palácio dos Festivais, que abriga o Mercado do Cinema, parecia quase deserto.
Segundo a direção dessa área, os participantes físicos passaram do recorde de 12.527 em 2019 para cerca de 5.000 neste ano, mas outros cerca de 5.000 participantes mantiveram negociações online. O festival afirmou também que as reservas para o ano que vem já mostram aquecimento.