Fazenda na Califórnia e câncer de tia motivaram ação sobre maconha que chegou ao STJ

Fazenda na Califórnia e câncer de tia motivaram ação sobre maconha que chegou ao STJ

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Brasil CANNABIS-MEDICINAL 18/06/22 POR Folhapress

FERNANDA MENASÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Depois de três temporadas de trabalho na colheita de uma fazenda de maconha no norte da Califórnia (EUA), o designer paulista Bardas (nome fictício), 29, precisou recorrer à Justiça para poder manter, na volta ao Brasil, seu bem-sucedido tratamento para ansiedade e insônia a partir de princípios ativos da Cannabis.

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Na última terça-feira (14), a 6ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) concedeu a ele e a outras duas pessoas salvo-conduto para plantação doméstica de maconha e produção de óleos destinados ao uso terapêutico pessoal, sem que isso represente risco de serem investigados, denunciados, presos, julgados ou condenados pelo crime de tráfico de drogas.

Trata-se da primeira decisão favorável ao cultivo doméstico de pacientes para fins terapêuticos pessoais da segunda mais alta câmara do Judiciário brasileiro, o que ajuda a consolidar uma jurisprudência sobre um tema cada vez mais judicializado no Brasil.Ainda assim, toda vez que Bardas fala do assunto, suas mãos suam frio. O jovem não imaginou que seu caso chegaria tão longe. Afinal, conta ele, na volta ao Brasil conheceu outras pessoas que obtiveram a mesma decisão logo de cara, em primeira instância, não dois anos depois de iniciada uma batalha judicial pelo tema -que ele conta que nem pretendia encarar.

Ao voltar para o Brasil, Bardas já sabia que sua receita médica americana e o documento de paciente, necessários para a compra de medicamentos à base de Cannabis em solo californiano, não tinham validade.

O caminho brasileiro para adquirir os óleos ricos em CBD (canabidiol) que ele usava nos EUA era obter um pedido médico no Brasil e requerer autorização junto à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para importar os produtos. Mas, no final desse percurso, tinha uma pegadinha: o alto custo dos medicamentos.

Desde 2015 o uso compassivo do canabidiol para fins terapêuticos é permitido no país. Em 2019, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) regulamentou a venda de produtos à base de maconha em farmácias e, em 2020, concedeu registro ao primeiro produto do tipo. Ainda que para a agência esses produtos não sejam remédios e, sim, fitofármacos, a compra depende de prescrição médica com receituário especial.

Como o cultivo de maconha não é permitido no país, os medicamentos ou seus insumos têm que ser importados, resultando em maior custo para o paciente ou para o SUS (Sistema Único de Saúde).

Bardas rapidamente calculou que manter o tratamento custaria cerca de R$ 2.000 ao mês. A conta simplesmente não fechava. Além disso, era frustrante não poder aplicar no Brasil o conhecimento adquirido na Califórnia sobre a lida com a planta e o fabrico dos óleos. A produção doméstica, ele calculava, reduziria os custos a ponto de tornar o uso terapêutico possível também no Brasil.

Ainda assim, a coragem para dar o primeiro passo, diz ele, só veio a partir de uma má notícia: sua tia descobriu um câncer de mama e iniciou um tratamento repleto de efeitos colaterais que, ele sabia, a Cannabis poderia aliviar. Estudos já comprovaram que o canabidiol tem, entre outros, efeito antiemético, auxiliando no combate às náuseas e à falta de apetite típicas das quimioterapias e radioterapias.

Era o incentivo que faltava. Bardas entrou na Justiça com um habeas corpus para poder plantar Cannabis e produzir os óleos necessários ao tratamento da tia e ao seu próprio sem correr o risco de ser encarado como um traficante por causa disso. Animado pelos outros casos que encontrou nas suas pesquisas, iniciou o cultivo das plantas.

Bardas só não imaginava que a mesma Justiça à qual ele recorria em busca de uma solução para seu impasse no exercício do direito à saúde escondia uma arapuca.

"O juiz de primeira instância não só entendeu que o habeas corpus não cabia como determinou que ambos os pacientes fossem investigados pela Polícia Federal e que fosse aberta uma sindicância no Conselho Regional de Medicina contra a psiquiatra que receitou canabidiol para eles", conta a advogada Gabriella Arima, que conduziu o caso com Cecília Galicio, ambas parte da Rede Reforma, que reúne profissionais do direito atuantes no campo da política de drogas.

"Foi um processo em que houve empecilhos grandes e até violações por parte do Judiciário. Mas essas violações foram posteriormente corrigidas pela sensibilidade dos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 3ª região, que reverteram a decisão", conta ela.Como o Ministério Público Federal recorreu aos dois tribunais superiores, depois da decisão do STJ, resta um recurso pendente no STF (Supremo Tribunal Federal).

Para o advogado Emílio Figueiredo, pioneiro no Brasil no uso do habeas corpus para garantir o cultivo para uso medicinal pessoal, a decisão do STJ confirma a tese "de uso do direito penal para garantir o direito à saúde".

"Em vez de esperar a polícia chegar e fazer as provas, o paciente se antecipa, produz suas provas e as apresenta perante a Justiça, confirmando que quem cultiva Cannabis para fins de tratamento com respaldo médico não pode ser considerado um criminoso", explica ele, também membro da Rede Reforma.

Figueiredo lembra que o STF tem dois processos parados sobre o tema, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade e um recurso extraordinário, e critica também o principal projeto do Legislativo na área, o PL 399.

"Mesmo com todo o avanço que faz, o PL 399 é omisso em relação ao fato social de que pessoas cultivam Cannabis para fins terapêuticos em suas casas. O cultivo doméstico não é nem sequer previsto."

Para Arima, a decisão alcançada por seu cliente no STJ "é importante por ser a primeira por parte de um tribunal superior a reconhecer o habeas corpus como instrumento jurídico de proteção da segurança e da liberdade dos cidadãos que são pacientes, fazem uso medicinal da Cannabis e querem cultivar a própria planta".

"A judicialização vem sendo perseguida por muitos pacientes, mas o ideal é que a gente não precise mais do Judiciário para isso", completa.

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