Renda dos 5% mais pobres não compra nem dois pratos feitos por mês

Renda dos 5% mais pobres não compra nem dois pratos feitos por mês

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Economia ECONOMIA-RENDA 25/06/22 POR Folhapress

LEONARDO VIECELIRIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Em uma metrópole como São Paulo, a renda dos brasileiros 5% mais pobres pode não ser suficiente nem para comprar duas unidades do famoso prato feito, o pê-efe, ou um quilo de carne por mês.

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Em 2021, os cerca de 10 milhões que integravam esse grupo no país viram o rendimento mensal domiciliar per capita (por pessoa) despencar para R$ 39 em média.

O tombo foi de 33,9% ante 2020 (R$ 59), o mais intenso entre as camadas da população investigadas na Pnad Contínua: Rendimento de Todas as Fontes 2021.

A pesquisa, divulgada neste mês pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), vai além do mercado de trabalho e também avalia a renda obtida com outras fontes de recursos, como benefícios sociais, aposentadorias e aluguéis.

Na capital paulista, uma refeição ao estilo prato do dia ou prato feito saía por R$ 23,90, em média, em outubro de 2021, segundo levantamento feito pelo Procon-SP em parceria com o Dieese.

Ou seja, em uma situação hipotética, os R$ 39 da renda dos brasileiros 5% mais pobres ficariam abaixo do valor de apenas dois pê-efes: R$ 47,80.

O rendimento da camada mais vulnerável também era inferior, por exemplo, ao preço de um quilo de carne de primeira na capital paulista.

Em dezembro de 2021, o produto custava R$ 42,89 em média, de acordo com outra pesquisa realizada pelo Procon-SP em parceria com o Dieese.

Na visão de economistas, os dados ilustram o tamanho do desafio social que o país enfrenta após a chegada da pandemia.

Além de serem afetados pelas restrições de inserção no mercado de trabalho e pela inflação em escalada, os mais pobres também sentiram a redução ou o fim de benefícios sociais como o auxílio emergencial, criado em 2020 e encerrado em 2021.

"No início do auxílio emergencial, a gente viu um efeito grande no combate à pobreza, e isso tinha de ser feito. Agora, a situação está muito difícil. A fila de espera por ajuda está crescendo", diz o economista Alysson Portella, pesquisador do Insper.

Em dezembro de 2021, o preço médio de um botijão de gás de cozinha de 13 quilos foi de R$ 102,32 no Brasil, conforme a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).

Isso significa que, em uma família de três pessoas e com renda de R$ 39 por integrante, a compra de um botijão consumiria 87,5% do rendimento total (R$ 117).

Segundo os dados divulgados pelo IBGE neste mês, a renda individual também despencou mais de 30% na faixa dos brasileiros que estavam acima dos 5% e até os 10% mais pobres do país.

De 2020 para 2021, o rendimento médio mensal desse grupo recuou de R$ 217 para R$ 148 por pessoa, uma baixa de 31,8%, a segunda mais intensa da pesquisa.

"O pior é que, além de a renda das camadas mais pobres ser muito baixa, ela é instável. Flutua muito", afirma o economista Marcelo Neri, diretor do centro de políticas sociais FGV Social."Nos últimos anos de pandemia, com a entrada e a saída do auxílio emergencial, essa volatilidade aumentou", completa Neri, que chama atenção para o aumento da fome no Brasil como uma das consequências da atual crise.Segundo análise recente do FGV Social, a partir de dados do Gallup World Poll, a parcela de brasileiros sem dinheiro para alimentar a si ou a sua família em algum momento dos últimos 12 meses subiu de 30% em 2019 para 36% em 2021. O percentual é recorde na série iniciada em 2006.'ÀS VEZES, A GENTE NÃO CONSEGUE NADA', DIZ MÃESimone Maria Cordeiro, 47, viu a renda do trabalho como recicladora ficar mais incerta e enxuta após os impactos da pandemia e da inflação alta."Depende muito do dia. Às vezes, a gente não consegue nada", conta.Para bancar as despesas familiares, a moradora do Rio de Janeiro depende de doações e recursos do Auxílio Brasil e do Auxílio Gás, que somam mais de R$ 500.Simone tem 11 filhos. Seis deles ainda vivem com ela em uma ocupação."Uma das salvações é que eles estudam e ganham café da manhã ou almoço na escola. Isso ajuda muito", conta."A gente vai para o supermercado, mas compra só o suficiente para se manter por alguns dias. Estou lutando pela minha sobrevivência e da minha família", acrescenta.Responsáveis por iniciativas sociais relatam que a procura por doações de mantimentos segue aquecida, mesmo após as fases mais críticas da pandemia.Atualmente, 33 milhões de pessoas passam fome no país, apontou o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, divulgado neste mês.O contingente é similar ao registrado 30 anos atrás. Em 1993, eram 32 milhões nessa situação."A gente percebe quando a situação piora nos territórios em que a gente atua antes de os dados do IBGE mostrarem isso", afirma Rodrigo "Kiko" Afonso, diretor-executivo da ONG Ação da Cidadania."Qualquer melhora [no apoio aos vulneráveis] passa pelo combate à fome. Se a pessoa não comer, não vai conseguir procurar emprego ou estudar. Ela precisa comer", acrescenta.'ASSISTÊNCIA SOCIAL NA VEIA', AFIRMA ECONOMISTAO economista Ely José de Mattos, professor da Escola de Negócios da PUCRS, avalia que uma melhora do cenário para as camadas mais pobres é ameaçada por uma série de dificuldades previstas para o segundo semestre de 2022.Entre os riscos estão os sinais de desaceleração da atividade econômica, inflação persistente e um mercado de trabalho que não está totalmente recuperado das crises recentes.Conforme Mattos, o combate à pobreza passa por projetos do poder público que considerem as diferenças existentes dentro dos grupos mais vulneráveis."Para os 5% mais pobres, é assistência social na veia. Não tem como ser muito diferente", afirma."Se pegar uma foto dos 25% mais pobres, entre eles há muitas diferenças [...]. Para alguns perfis, a gente pode trabalhar com inclusão produtiva direta, treinamentos específicos. Tudo isso é política governamental bastante direcionada", emenda.Com a crise econômica às vésperas das eleições, o governo Jair Bolsonaro (PL) trocou o Bolsa Família, associado a gestões petistas, pelo Auxílio Brasil, cujas famílias beneficiárias recebem um mínimo de R$ 400.Contudo, como mostrou reportagem da Folha de S.Paulo, o novo programa ainda registrava uma fila de 764,5 mil famílias em maio."A gente tem de olhar com carinho para os grupos mais pobres. Inflação e desemprego são dois males vividos mais fortemente por eles", afirma o economista Marcelo Neri, do FGV Social."No caso dos programas sociais, houve um desajuste. A gente precisa fazer uma volta a um aprendizado: quem é mais pobre tem de receber mais recursos do que os demais, famílias maiores também", acrescenta.

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