© Ueslei Marcelino/Reuters
(FOLHAPRESS) - Uma posição antiga do pastor Silas Malafaia virou munição eleitoral contra o homem que hoje o chama de conselheiro, Jair Bolsonaro (PL).
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A campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pagou por anúncios no YouTube para dar visibilidade a um vídeo intitulado "Eu não acredito que concordei com Malafaia", que intercala críticas do líder evangélico ao armamento com falas do presidente a favor do assunto.
Um dos maiores cabos eleitorais de Bolsonaro entre evangélicos, Malafaia afirma à Folha de S.Paulo que de fato não compactua "com o negócio de arma" e que "é aliado, não alienado", portanto não vai prestar continência a tudo o que o presidente diz. "Não sou bolsominion."
O vídeo original do pastor é de 2015 e tem críticas a um projeto de lei que previa uma revisão do Estatuto do Desarmamento, concebido para reduzir a circulação de armas no Brasil. Ele pede que deputados evangélicos votem contra o projeto.
O vídeo começa com Malafaia afirmando que a ideia de rever o estatuto "é um verdadeiro absurdo". Em seguida, entra Bolsonaro falando: "Eu quero todo mundo armado!".
A montagem continua com esse jogo de oposição entre declarações do religioso e do capitão reformado. Malafaia, por exemplo, fala em "lobby das indústrias de armas", e o presidente apregoa: "Quanto mais armas na mão do cidadão de bem, diminui a violência".
"Armar o cidadão, isso aí é uma loucura", diz o pastor. Corta para Bolsonaro: "Eu não tenho medo do povo armado, muito pelo contrário".
O uso eleitoral desse vídeo irritou Malafaia. "Sou um aliado do presidente, mas não sou obrigado a dizer amém pra tudo o que ele pensa. Podem usar o que quiserem. E por causa disso vou deixar de apoiar ele?"
A campanha de Lula pagou desde o dia 19 de outubro para exibir o anúncio no YouTube com a edição feita pela campanha petista. Com isso, ele é visto por usuários da plataforma do Google que clicaram em outros vídeos.
O anúncio, permitido na legislação eleitoral, foi segmentado para usuários do YouTube no Rio de Janeiro, terra de Malafaia e onde Bolsonaro fez carreira política. Teve cerca de 25 mil visualizações.
O líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo diz que não mudou de posição e continua contrário ao armamento da população. Ele, contudo, relativiza: "Nunca fui afeito a arma. Agora, as pessoas terem direito [a armas] é outra questão".
Ele lembra do referendo de 2005 que questionou se as armas de fogo deveriam ou não ter sua venda proibida no país. Na época, 64% dos brasileiros votaram "não" contra o Estatuto do Desarmamento, sancionado em 2003 pelo então presidente Lula. Ele, contudo, continuou valendo.
Frisa ainda que a decisão de 2005 deve ser respeitada, ou seria "uma afronta ao supremo poder que é o povo" –embora ele mesmo tenha dito, sete anos atrás, que era um disparate rever o estatuto.
A questão armamentista é uma espinha em gargantas bolsonaristas nas igrejas. Tema caro ao presidente, não é bem visto por muitos líderes, que preferem silenciar para não contrariar Bolsonaro.
O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-AL), presidente da bancada evangélica e membro da igreja de Malafaia, era uma exceção disposta a falar.
Em 2021, disse à Folha de S.Paulo que, "com um fuzil na mão de cada cidadão, vamos criar um problema contra a vida humana ainda maior do que os que já temos".
Mas deu um desconto a Bolsonaro. "O segmento entende que ele está falando para os armamentistas. Nós ignoramos. E valorizamos o que nos une, não o que nos separa."
Pesquisa Genial/Quaest de agosto mostra que evangélicos têm, em geral, posição antipática a armas.
Exemplo: 66% refutam a ideia de comprar uma arma para se defender, 74% acreditam que pessoas armadas podem se envolver em tiroteios mais facilmente e só 19% dizem que se sentem mais seguros sabendo que o vizinho tem uma arma. Não há discrepâncias relevantes com a opinião de outros grupos religiosos.