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JOÃO PEDRO PITOMBO E JULIA CHAIBSALVADOR, BA, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Menos de um dia depois de uma ação policial que deixou dez pessoas mortas em Guarujá (SP), o ministro Flávio Dino (Justiça) classificou o ocorrido como uma reação que "não parece proporcional" e cobrou uma investigação independente do episódio, protagonizado pelas forças de segurança do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos).
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Semanas depois, o mesmo Dino chamou de "desafiador" o cenário da segurança pública na Bahia, governada pelo aliado Jerônimo Rodrigues (PT). O estado registrou mais de 50 mortes em operações policiais em setembro. Seu número dois no ministério, Ricardo Cappelli, foi mais incisivo e disse que não se enfrenta o crime organizado com rosas.
Em São Paulo, o saldo em 40 dias de operação no litoral do estado foi de 28 pessoas mortas.
A escalada da violência na Bahia, o avanço da letalidade policial e os sinais trocados ao lidar com governadores aliados e adversários fizeram o governo Lula (PT) ser criticado e acusado de patinar na gestão da crise da segurança pública que assola os estados.
Aliados reclamam que de que o ministério ainda não apresentou um plano amplo na área, se concentrou nos eventos de 8 de janeiro e tem dado declarações polêmicas.
"É lastimável a fala [de Capelli] porque reforça a narrativa de visão de segurança pública da direita, que leva a uma letalidade policial sistemática contra a população pobre e negra das periferias", disse à reportagem Benedito Mariano, secretário de Segurança de Diadema, cidade da Grande São Paulo comandada pelo petista José de Filippi Júnior.
Apesar da segurança pública ser uma competência dos estados, Lula já disse a aliados que quer criar uma marca nessa área. Além das cobranças que o petista tem recebido, ele vê no tema uma possibilidade de se aproximar das polícias militares, grupo próximo do bolsonarismo.
Nesta segunda-feira (2), o Ministério da Justiça apresentará um plano de combate ao crime organizado com foco em ações integradas entre o governo federal, estados e municípios. Com o movimento, governistas querem amenizar críticas à gestão da segurança até mesmo de governos de oposição.
Integrantes do governo federal atrelam a crise da segurança em estados como a Bahia ao avanço das facções criminosas, que se nacionalizaram, e evitam criticar as polícias. Ao mesmo tempo, associam o problema à flexibilização do acesso a armas na gestão Jair Bolsonaro (PL).
A correlação é rechaçada por bolsonaristas, mas membros do governo destacam que armas de CACs (Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores) podem ter ido parar nas mãos de criminosos. Eles também dizem que há 6.000 armas de uso restrito, incluindo fuzis, que não foram recadastradas. Há suspeita de que parte desse arsenal tenha sido desvirtuada.Na Bahia, foram apreendidas 3.706 armas neste ano pelas polícias, incluindo 48 fuzis –no ano passado, foram 22 fuzis.
"Não podemos repetir erro dos últimos quatro anos onde houve por parte do governo federal um incentivo, uma liberação para que cada pessoa tenha 40 armas, 50 armas. [...] A gente está vendo esse armamento e munições caindo nas mãos dos criminosos", disse na terça (26) o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT).
Governador entre 2015 e 2022, Rui enfrentou um avanço no número de mortes violentas na sua gestão, o que fez a Bahia virar o estado com mais assassinatos no país desde 2019. O cenário adverso inclui um crescimento nas mortes decorrentes de intervenção policial, que quadruplicaram na gestão do petista.
Ao ser confrontado com os indicadores em julho, o ministro disse não reconhecer os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e afirmou que o governo estuda um marco legal para definir um parâmetro único para o registro de mortes violentas.
Entre petistas e integrantes do governo, há uma visão de que a gestão da segurança na gestão Jerônimo, que sucedeu Rui no cargo, se tornou uma espécie de "teto de vidro" para o governo federal.
O estado enfrenta um de seus momentos mais graves na gestão da segurança, com o acirramento da guerra entre facções, chacinas e crescimento da letalidade policial. O epicentro são as periferias das grandes cidades.
O cenário de crise fez o governo recalcular a rota, evitar críticas e defender publicamente um discurso de parceria com os governadores nessa área. Nas últimas semanas, o governo federal enviou para a Bahia veículos blindados e dobrou a aposta em ações conjuntas com as polícias militar e civil.
Uma ala do PT critica a gestão de Dino na segurança pública, vê cautela do ministro e defende que ele deveria ser mais incisivo em relação à atuação da polícia baiana. Essa ala ressalta ainda a diferença nas atitudes de Dino ao tratar dos casos da Bahia e de São Paulo.
Em nota enviada nesta sexta (29), o Ministério da Justiça afirmou que Dino, ao tratar do episódio em São Paulo, "falou em desproporcionalidade, mencionando um critério jurídico qualitativo".
O secretário de Segurança do Ministério da Justiça, Tadeu Alencar, rechaça que tenha havido tons diferentes no tratamento dado à Bahia e a São Paulo: "Não vejo [diferença]. Até porque a diretriz que está orientando a nossa atuação é justamente não fazer distinção. É tratar todos os estados dessa matéria com absoluta imparcialidade e impessoalidade", afirma.Ele ainda destaca que o governo federal não vai "trabalhar com essa perspectiva de que a polícia está permanentemente sob suspeição". Disse ainda que a administração federal confia no trabalho das forças de segurança.
"Nós não pensamos dessa forma [que elas são sempre suspeitas] porque confiamos na polícia e achamos que os seus excessos, quando existentes, têm que ser responsabilizados."
Mesmo quando há mortes na ação policial, pondera o secretário, nem sempre elas estarão erradas. "É dizer que o crime tem sempre razão. Não vamos nunca fazer esse tipo de conclusão."O plano que será lançado na segunda terá um trecho sobre fortalecimento de operações correcionais das polícias. A preocupação, segundo ele, é garantir que haja equilíbrio nas ações, além de correta investigação e punição posterior. Ele diz, no entanto, que isso não pode levar a uma suspensão de ações policiais.
Pedidos por uma possível intervenção federal na segurança da Bahia estão sendo desconsiderados no governo federal, repetindo a mesma postura de março, quando foram registrados mais de duas centenas de ataques criminosos no Rio Grande do Norte.
À época, Dino afirmou que estado comandado por Fátima Bezerra (PT) enfrentava "duas violências, uma física e uma política", em alusão à pressão de senadores para o emprego das Forças Armadas para controlar os ataques.
Em nota, o Ministério da Justiça reiterou estudos nacionais e internacionais que mostram correlação entre armamentismo e violência e destacou que defende uma postura de enfrentamento ao crime pelas polícias conforme a lei, com uso progressivo e proporcional da força.
"Isso depende da análise de cada caso, levando em conta, por exemplo, a reação à presença da polícia, e os armamentos utilizados na situação, informou.
O ministério ainda disse estar trabalhando para definição do modelo para a instalação de câmeras nos uniformes dos policiais e destaca que a nova matriz curricular para formação policial enfatiza o respeito à lei sobre o uso da força.
Sobre o combate ao crime organizado, a pasta afirma que as operações são diárias e que os bens apreendidos pela Polícia Federal com criminosos é o dobro da média dos últimos anos.
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