'Temer já entrou refém dos grupos de interesse', afirma Marcos Lisboa

País pode voltar a ter uma crise severa nos próximos anos, avalia economista

© Ueslei Marcelino / Reuters

Política opinião 17/06/18 POR Estadao Conteudo

Economista e presidente do Insper, Marcos Lisboa está preocupado com os rumos do País. Em sua visão, o governo Michel Temer já nasceu refém da pressão de grupos organizados e cedeu em demasia a corporações, que se opõem a reformas. "Ficamos um ano no 'dois para lá, dois para cá'. Mas, desde setembro, é só retrocesso", diz o ex-secretário de Política Econômica do governo Lula. Sem deter o lobby das corporações e debater com seriedade o problema fiscal na campanha, as perspectivas são muito ruins, diz. "O País pode voltar a ter uma crise severa nos próximos anos."

PUB

O que levou um governo, com postura supostamente pró-mercado, a tabelar preços?

O sucesso dos grupos de interesse em pressionar para preservar benefícios ou expandi-los vem de muito tempo. Esse governo começou concedendo reajuste a servidores em meio à grave recessão. Veio a derrota na renegociação de dívidas do Estado, quando tentou contrapartidas de transparência e não conseguiu. Depois foram aprovados Refis, uso do FGTS para turbinar a Caixa, benesses para agricultores que chegam a R$ 17 bilhões, não se aprovou a reforma da Previdência. O episódio dos caminhoneiros foi apenas o exemplo mais recente de longa trajetória de sucesso de grupos de interesse, que chantageiam o governo. Não faltam exemplos de retrocesso do Brasil.

O governo sempre foi fraco?

A fraqueza sempre existiu em relação aos grupos organizados. É um legado do governo anterior. Desde 2008 vimos lideranças que pareciam acreditar que desenvolver é dar crédito subsidiado, proteger da concorrência estrangeira, criar regras de conteúdo nacional, dar distorções tributárias. O País caiu nessa falácia. Vemos agora o que os economistas chamam de "problema da persistência de política". Você faz esse tipo de política, fortalecendo ou criando grupos de interesse. Na hora que tenta revertê-la, eles dizem: "não sobrevivo sem". O País fica refém do fracasso. Vimos com o Inovar-Auto, indústria naval, diversos setores. Agora a sociedade não consegue retirar o privilégio.

Mas antes de 2008 não havia?

É uma característica do País, mas foi muito intensificada a partir de 2008 com as intervenções setoriais. E o governo Temer entrou refém dos grupos de interesse. Perdeu em alguns pontos, mas cedeu demasiadamente em outros considerando o interesse do País.

Muitos apostavam na habilidade política dos emedebistas para empurrar a agenda reformista.

Superestimamos o poder da presidência e menosprezamos a importância do parlamento. Várias medidas foram apoiadas e aperfeiçoadas pelo parlamento. Durante um ano, houve esse benefício. Era um jogo de "dois para lá, dois para cá". Eram aprovadas medidas na direção da agenda que chamo de republicana - de tratar iguais como iguais, dar transparência aos subsídios públicos, expandir a concorrência - e então vinham medidas na contramão. Mas depois disso foi só gol contra. Desde setembro, é só retrocesso. E aí, realmente, o País pode voltar a ter uma crise muito severa nos próximos anos.

A maior parte da população apoiou a greve, ou seja, apoiou a pressão de grupos organizados.

É parte da cultura que permite a disseminação das "meias-entradas". Sempre achamos que há uma entidade mágica pagando a conta, que é só terminar a corrupção, ou ter pessoas muito ricas pagando mais. Nada. Quem paga o subsídio ao caminhão e o salário maior do setor público é o resto da sociedade de forma difusa. Isso se traduz em preços mais caros no Brasil pela quantidade de impostos indiretos, essa profusão da tributação sobre as empresas.

Como seguir a agenda reformista se aparentemente as pessoas não a apoiam?

Achei que após a crise de 2014, 2015 e 2016, a ficha tinha caído para a maioria. Se você vai fazer navios, conteúdo nacional para óleo e gás, deixará de fazer estradas para infraestrutura. Não tem geração espontânea (de dinheiro). Achei que a crise tinha deixado claro que essas escolhas, de concessão de benefícios e proteções, têm impacto difuso sobre o resto da sociedade. Mas parece que não. As pessoas aplaudiram a greve dos caminhoneiros e uma semana depois tomaram um susto porque há uma conta a pagar. Se o nível de incompetência chega a esse ponto, não há muito o que fazer.

O sr. dizia acreditar que havia neste ano ambiente mais favorável a se debater privatizações e reformas. Ainda acredita?

Não podemos perder a perspectiva histórica. O debate hoje está muito melhor do que há cinco anos. O que surpreende é a força dos grupos organizados. Temos uma sociedade dividida entre o Brasil velho - dos cartórios, das corporações, dos grupos que dependem de mesada oficial - e o Brasil novo que diz: estamos quebrando o País. Tem muita empresa abandonando o Brasil. Quem está mais perto do economia real vê. E a campanha eleitoral está surpreendendo com a superficialidade das propostas, com barbaridades que são ditas. Estou preocupado. Vemos um processo de degradação do País, deterioração do patrimônio público. Haverá consequências danosas no médio prazo. E a culpa é nossa. Deixamos a situação se degradar ao não enfrentar as corporações. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

PARTILHE ESTA NOTÍCIA

RECOMENDADOS

mundo Insólito Há 10 Horas

Viúvo casa com sogra e cerimônia é organizada pelo sogro; entenda

mundo RÚSSIA-UCRÂNIA Há 9 Horas

Putin ameaça ataque nuclear contra o Ocidente na Ucrânia

mundo México Há 11 Horas

Três turistas são mortos e jogados em poço em viagem de surf no México

mundo França Há 4 Horas

Jovem mata a avó com serra elétrica e tenta esconder corpo no galinheiro

mundo Espanha Há 6 Horas

Jovem morre atropelado por metrô após descer à linha para urinar

politica Bolsonaro Há 10 Horas

Bolsonaro volta a ser internado em Manaus após infecção na perna e no braço

brasil Rio Grande do Sul Há 11 Horas

Quase 850 mil pessoas são afetadas por chuvas no Rio Grande do Sul

mundo EUA Há 12 Horas

Polícia surpreende homem que queria companhia para festejar aniversário

brasil CHUVA-RS Há 13 Horas

Temperaturas caem e RS terá onda de frio a partir de quarta-feira (8)

mundo EUA Há 4 Horas

Homem dispara contra padre durante missa e arma trava: "Milagre"