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Após queda de 50% nos diagnósticos, pacientes de câncer enfrentam adiamento de cirurgias

Segundo levantamento do Radar do Câncer, do Instituto Oncoguia, as biópsias tiveram uma redução de 39,11% (de 737.804 para 449.275), entre março e dezembro do ano passado, em comparação ao mesmo período de 2019

Após queda de 50% nos diagnósticos, pacientes de câncer enfrentam adiamento de cirurgias
Notícias ao Minuto Brasil

11:00 - 11/03/21 por Folhapress

Brasil SAÚDE-CÂNCER

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O diagnóstico de novos casos de câncer caiu até 50% no país em 2020 e, com o atual colapso de hospitais devido à Covid-19, os pacientes oncológicos já enfrentam novos cancelamentos de consultas e cirurgias.

Segundo levantamento do Radar do Câncer, do Instituto Oncoguia, as biópsias tiveram uma redução de 39,11% (de 737.804 para 449.275), entre março e dezembro do ano passado, em comparação ao mesmo período de 2019. As maiores quedas ocorreram nos meses de abril (-63,3%) e maio (-62,6%).

Em outros exames de diagnóstico, como o papanicolau e a mamografia, as reduções foram de 50% e 49,81%, respectivamente. O radar reúne informações compiladas do DataSUS e tem apoio da farmacêutica Roche.

A falta de um diagnóstico precoce e tratamento pode fazer com que um tumor em fase inicial cresça e se torne menos curável.

Segundo a psicóloga Luciana Holtz, fundadora do Oncoguia, em situações normais, o país já possui uma alta taxa de diagnóstico tardio do câncer, mas, agora, com a pandemia, tudo indica que o problema vai piorar.

Com o atual colapso dos hospitais devido ao aumento das internações por Covid-19, várias instituições estão suspendendo consultas e procedimentos eletivos, segundo relatos de pacientes ao instituto.

"De novo, temos pacientes com medo de procurar os serviços de saúde e hospitais cancelando cirurgias, procedimentos, consultas. Por incrível que pareça, a cirurgia de câncer é considerada eletiva, apesar de ela poder virar uma urgência amanhã."

Ela diz que o instituto tem conversado com os conselhos de secretários da Saúde alertando para a situação dos pacientes oncológicos. Mas, apesar de reconhecer a gravidade da desassistência, dizem que não há muito o que fazer neste momento.

"A gente se pergunta onde estão essas pessoas que não fizeram seus exames, as biópsias? O câncer não espera", afirma a psicóloga.

Para Luciana, muitos serviços privados mostraram que é possível continuar com a assistência oncológica de forma segura, com fluxos de atendimentos separados. "Os locais estão mais preparados, aprenderam com a pandemia."

Um outro estudo da Sociedade Brasileira de Urologia, de São Paulo, mostra uma redução média de 26% no número de novos casos de tumores de rim, próstata e bexiga, em 2020, em comparação aos diagnósticos feitos em 2019.

Os dados vêm de cinco instituições paulistas que atendem pacientes do SUS: Hospital Amaral de Carvalho, de Jaú, Instituto do Câncer da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Hospital AC Camargo, de São Paulo, Hospital das Clínicas da Unicamp, de Campinas, e Hospital São Paulo, da Unifesp, de São Paulo.

No HC da Unicamp, por exemplo, houve queda de 52% nos casos de câncer de bexiga, 61,04% nos de próstata e 63% nos de rim. No AC Camargo, as reduções foram de 24%, 48,8% e 29%, respectivamente. No Hospital São Paulo, houve diminuição de 25% nos casos de câncer de próstata e 35% nos de rim.

Segundo o urologista Geraldo de Faria, presidente da SBU-SP, só o câncer de próstata, a segunda maior causa de óbitos em homens, sofreu uma redução média de 33% entre todas as instituições pesquisadas.

Com base nesses dados, ele diz que é possível inferir que, no primeiro ano da pandemia, deixaram de ser realizados no estado de São Paulo cerca de 4.560 diagnósticos de novos casos.

"É muito preocupante. O tumor da próstata não costuma apresentar sintomas em fases iniciais. Ao apresentar sintomas, o câncer já pode estar numa fase mais avançada", diz ele.

O Inca (Instituto Nacional do Câncer) estimou que seriam realizados em 2020 cerca de 65.840 diagnósticos de novos casos de câncer de próstata.

A partir dessa previsão, a SBU-SP extrapolou os dados observados nas instituições e concluiu que cerca de 22 mil mil homens que desenvolveram a doença em 2020 deixaram de ser diagnosticados precocemente.

No Hospital AC Camargo, os casos diagnosticados de câncer colorretal (intestino grosso e reto) reduziram quase pela metade no pico da pandemia, entre março e julho, segundo artigo publicado no periódico British Journal of Surgery.

O número de pacientes caiu de 108, em 2019, para 58 em 2020 (redução de 46,3%). Ao mesmo tempo, houve um aumento de 25% de pacientes que chegaram ao hospital em estágios mais avançados do câncer.

"Ficar em casa esperando não foi uma boa decisão para esses pacientes. Há mais riscos de eles falecerem do câncer do que da Covid", diz Victor Piana, diretor médico do AC Camargo.

Ao todo, foram feitas 6.700 cirurgias oncológicas no hospital após o início da pandemia. Algumas encerram o ano em número abaixo do realizado em 2019, como as de tumores de pele, enquanto outras mais do que dobraram, como as de tumores cerebrais e de pulmão.

"Quanto mais silencioso o tumor, mais ele demorou para voltar aos níveis [de cirurgias] pré-pandemia. Quanto mais agressivo, mais rápida foi a volta aos patamares anteriores."

Em março de 2020, as cirurgias no AC Camargo chegaram a cair em mais de 50%. Em parte porque o paciente ficou com receio de frequentar ambientes hospitalares e também por precaução do hospital, que passou a adotar novos protocolos de segurança, como testes para o diagnóstico da Covid-19 antes das cirurgias.

"Covid não foi a doença mais complexa que chegou aqui para a gente tratar. Um hospital oncológico já está preparado para atender pacientes frágeis. Temos muitos leitos de isolamento na UTI, salas cirurgias com pressão negativa", conta Piana.

No momento, o diretor médico diz que o hospital segue a rotina, com leitos vagos, inclusive de UTI, sem previsão de cancelamento de cirurgias ou procedimentos. Mas já começa a perceber pacientes adiando consultas já agendadas.

Para evitar que a situação do ano passado seja repetida, o Instituto Oncoclínicas, em parceria com sociedades de especialidades médicas, entidades não governamentais de suporte a pacientes oncológicos, instituições de saúde e farmacêuticas, criou movimento O Câncer Não Espera.

A mobilização tem por objetivo alertar a sociedade para os riscos do adiamento de diagnósticos, exames, cirurgias e tratamentos contra o câncer, já que o tempo é decisivo em muitas condutas.

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