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Biden toma posse como presidente dos EUA em meio a crises sanitária e de segurança

Nesta quarta-feira (20), o democrata fará história ao assumir a Casa Branca em um dos momentos mais assustadores da trajetória americana

Biden toma posse como presidente dos EUA em meio a crises sanitária e de segurança
Notícias ao Minuto Brasil

05:32 - 20/01/21 por Folhapress

Mundo JOE-BIDEN

WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - Em seu último discurso antes de viajar a Washington e tomar posse como o 46º presidente dos EUA, Joe Biden não conseguiu conter o choro.
Agradeceu pelo apoio dos moradores de Delaware, estado onde viveu por quase 70 anos, e disse que sentia muito a ausência do filho Beau, que morreu em 2015 vítima de um câncer no cérebro. "Eu só tenho uma coisa a lamentar: ele não está aqui", disse Biden, visivelmente emocionado.

Nesta quarta-feira (20), o democrata fará história ao assumir a Casa Branca em um dos momentos mais assustadores da trajetória americana.

Aos 78 anos, Biden é o homem mais velho a chegar à Presidência dos EUA e tem a missão de comandar uma nação divida e devastada por uma grave crise econômica e uma pandemia que já matou mais de 400 mil pessoas no país.

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As credenciais inéditas da nova era incluem Kamala Harris, a primeira mulher negra a ocupar a Vice-Presidência americana, e que vai exercer papel definitivo no que se tornou o principal desafio de Biden nos próximos anos: conseguir, de fato, governar.

O avanço da maior crise de saúde do século, a violência política e o debate do impeachment de Donald Trump devem dominar os primeiros anos da gestão democrata, e especialistas acreditam que será difícil fazer muito além desses temas até meados de 2022.

O Partido Democrata tem maioria na Câmara, e Kamala terá direito ao voto de desempate no Senado, rachado entre 50 democratas e 50 republicanos. A frágil maioria numérica, porém, não é suficiente para a aprovação de todas as medidas prometidas por Biden, principalmente daquelas que exigem ao menos 60 votos para ganhar o aval legislativo sem obstrução de opositores.

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"Biden terá uma caixa cheia sobre sua mesa, mas o primeiro item é o coronavírus", afirma Melvyn Levitsky, professor na Universidade de Michigan e ex-diplomata dos EUA em Moscou.

Todos os outros temas, inclusive os relacionados à política externa, ele diz, terão que ser bastante trabalhados em meio à disputa das diferentes alas do Partido Democrata e às fileiras republicanas.

Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da FGV-SP, lembra que Barack Obama tinha maioria ainda mais ampla que Biden no Senado no início de seu primeiro mandato, mas não conseguiu aprovar medidas significativas sobre clima e imigração, por exemplo.

"Obama queria fazer mudanças no sistema de saúde, com o Obamacare, e precisou abrir mão de muita coisa para colocar o foco em um único tema. No caso de Biden, esse tema já está dado, é o combate à pandemia, e acho difícil ter espaço para muito mais do que isso nos dois primeiros anos", completa.

Na política há 48 anos, como vereador, senador e vice de Obama, Biden sabe que terá de lançar mão de seu perfil moderado e sua conhecida habilidade conciliatória para negociar com os dois lados do tabuleiro em meio à radicalização insuflada por Trump.

Ainda na campanha eleitoral, parte da equipe do democrata acreditava que sua eleição poderia normalizar a situação do país e pacificar as divisões inclusive no Partido Republicano, mas a escalada dos atos –que culminaram na invasão do Capitólio, em 6 de janeiro– mostraram que o terrorismo doméstico ganhou tração como uma das principais ameaças nos EUA.

Quando fizer seu primeiro discurso como presidente, pouco depois do meio-dia (14 horas de Brasília) desta quarta-feira, Biden insistirá na ideia de que os americanos precisam de união e pacificação para que a alma do país seja resgatada e suas fraturas, curadas. O democrata quer passar a mensagem de que a nação tem desafios, mas há esperança para resolver problemas.

Em seu livro de memórias, Obama afirma que seu discurso de posse, em janeiro de 2009, é menos lembrado do que o enorme laço no chapéu da cantora Aretha Franklin, que se apresentou na cerimônia, ou que a pequena gafe do presidente da Suprema Corte, John Roberts, que se enganou ao declamar um trecho da Constituição americana, induzindo-o ao erro ao recitar seu juramento.

No caso de Biden, dizem especialistas, o cenário é diferente, já que o democrata tem o início de governo mais difícil para um presidente desde que Franklin Delano Roosevelt assumiu a Casa Branca em 1933, com o desafio de combater a Grande Depressão.

A posse de um novo presidente tem tradição de mostrar a transição pacífica de poder nos EUA e os planos para o futuro. A primeira parte da história ficou comprometida neste ano com a recusa de Trump em comparecer à posse do sucessor, o que não acontecia há 152 anos.

O republicano não aceita totalmente a derrota e insiste na tese falsa de que as eleições foram fraudadas.

No entanto, mais importante que uma retórica floreada –que não é o forte de Biden–, o discurso de posse deve sinalizar de que maneira o novo presidente vai tomar as medidas para unificar o país fraturado por atos e insurreições que culminaram na invasão do Capitólio, que deixou cinco mortos.

Primogênito numa família de quatro filhos, Biden tinha gagueira crônica na infância, condição que foi amenizada com o tempo, mas ainda é apontada como razão para seus discursos pouco empolgantes.

A campanha vitoriosa à Casa Branca no ano passado, porém, moldou em parte a oratória do democrata e convenceu assessores de que, com bastante treino e disciplina, ele é capaz de falar sem grandes sustos.

Depois de seu pronunciamento nesta quarta, Biden pretende assinar diversas ordens executivas para reverter medidas colocadas em vigor por Trump.

As ordens executivas são uma maneira de driblar justamente a maioria apertada no Senado –e a possível dispersão das atividades da Casa com o debate sobre o impeachment do republicano. As manobras, no entanto, podem ser alvo da Suprema Corte, que hoje conta com ampla maioria conservadora, de 6 votos a 3.

Logo na primeira semana de governo, Biden quer colocar os EUA de volta na OMS (Organização Mundial da Saúde) e no Acordo de Paris. Promete também vacinar 100 milhões de americanos contra a Covid-19 em 100 dias e aprovar o plano de recuperação econômica no valor de US$ 1,9 trilhão (cerca de R$ 10 trilhões).

O montante inclui US$ 400 bilhões (R$ 2,1 trilhões) para o combate à pandemia, além de pagamento direto aos americanos, auxílio aos desempregados, a pequenas empresas, e a estados e municípios.

Biden quer também suspender o banimento de entrada nos EUA a viajantes de alguns países de maioria muçulmana, parar a construção do muro na divisa com o México, símbolo inacabado do governo Trump, e impedir a separação de famílias na fronteira.

Especialista em relações bilaterais, o professor Levitsky acredita que, com essas e outras medidas, o democrata buscará "consertar o tecido rasgado de nossas alianças."

"De modo geral, Biden tentará restaurar a liderança dos EUA nos assuntos internacionais. A promoção dos interesses dos EUA estará na frente, mas não será mais apenas a América [como pregava Trump]."

O perfil de Biden é considerado ideal para o momento turbulento, já que ele não é hiperbólico ou incendiário, e montou uma equipe de especialistas moderados, que estão há meses preparando seu plano de governo.

"Com décadas de experiência política e demonstrada inclinação para atravessar o corredor [do Congresso, fazendo a ponte entre os partidos], Biden está bem preparado para reparar relações tensas ou rompidas com membros da comunidade internacional, enquanto trabalha para a reorganização gradual do sistema global", afirma Pauline Jones, especialista em ciência política.

Depois de décadas atuando como senador no Congresso, o democrata sabe que os parlamentares desejam aprovar medidas populares que podem ajudar em suas eleições nos estados, mas que, muitas vezes, também aceitam em troca amargar medidas mais controversas.

Integrantes de sua equipe, porém, já vislumbram dificuldades de Biden para equilibrar projetos que precisam do apoio bipartidário com acenos à ala mais à esquerda do Partido Democrata, que seguirá pressionado por reformas estruturais, principalmente nas áreas de saúde e meio ambiente.

O primeiro teste de Biden no Congresso será a confirmação de nomes escolhidos para seu gabinete –ao contrário do Brasil, indicados pelo presidente para determinados cargos no primeiro escalão precisam da aprovação do Senado americano.

O democrata já disse esperar que os parlamentares adotem uma estratégia dupla que permita realizar o julgamento de impeachment de Trump –acusado de incitação à violência que resultou no ataque ao Capitólio e na morte de cinco pessoas– e, ao mesmo tempo, aprovar suas indicações e as medidas de alívio à pandemia.

O impeachment de Trump já foi aprovado pela Câmara na semana passada e segue para a apreciação dos senadores, tornando o republicano o primeiro presidente impichado duas vezes pelos deputados nos EUA.

Em janeiro de 2020, porém, Trump foi absolvido pelo Senado que, à época, tinha maioria republicana.

Apesar da derrota na eleição e do processo de impeachment, Trump ampliou sua base eleitoral e conquistou 74 milhões de votos na disputa do ano passado –11 milhões a mais do que obteve em 2016.

Com 81 milhões de votos, Biden deve ter cuidado para não tentar fazer com que sua chuva de promessas seja um eclipse do ativo político de seu antecessor.

Em seu discurso de despedida, na véspera da posse de Biden, Trump não chorou. "Enquanto me preparo para entregar o poder a uma nova administração, ao meio-dia de quarta-feira, quero que saibam que o movimento que iniciamos está apenas começando", disse o republicano.

Numa nação dividida, os caminhos para unidade são lentos e tortuosos.

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