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Vaticano tem uma das maiores comunidades gays do mundo, diz escritor

Frédéric Martel escreveu o livro 'No armário do Vaticano', lançado hoje mundialmente

Vaticano tem uma das maiores comunidades gays do mundo, diz escritor
Notícias ao Minuto Brasil

05:20 - 21/02/19 por Lusa

Mundo Opinião

O escritor francês autor do livro 'No armário do Vaticano', lançado hoje mundialmente, considera que o Vaticano tem uma das comunidades homossexuais mais elevadas do mundo o que explica, em parte, o encobrimento de crimes sexuais.

"Duvido que no Castro de São Francisco, esse bairro gay tão emblemático, hoje em dia mais misturado, haja tantos homossexuais", defende Frédéric Martel no seu livro, escrito depois de quatro anos de investigação, em que ouviu testemunhos de mais de 1.500 pessoas no Vaticano e em 30 países.

No caso dos cardeais mais velhos, explica, este segredo tem de ser procurado no passado: "A sua juventude tempestuosa e os seus anos brejeiros, antes da libertação gay, explicam a sua vida dupla e a sua homofobia à antiga".

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Entre as pessoas que entrevistou estão 41 cardeais, 52 bispos e monsenhores, 45 núncios apostólicos e embaixadores estrangeiros e mais de 200 padres e seminaristas.

Muitos dos cardeais e prelados da cúria romana, a maioria dos que se reúnem em conclave sob os frescos da Capela Sistina pintada por Michelangelo, partilham as mesmas "inclinações", parecem uma família, afirma o jornalista.

"Com uma referência mais disco Queen, um padre me contou em segredo 'We are family', escreve o autor.

A maior parte dos monsenhores que usaram da palavra na varanda da Lógia de São Pedro, entre o pontificado de Paulo VI e o de Francisco, para anunciar a morte do papa ou lançar, com uma franca alegria "habemus papam" tem um mesmo segredo em comum.

"O mundo que descubro, com a suas 50 sombras de gay, está para lá do entendimento", advoga.

Para o autor, a homossexualidade é também "uma das chaves de explicação do encobrimento institucionalizado de crimes e delitos sexuais que hoje em dia se contam às dezenas de milhar" porque a cultura do segredo para esconder a homossexualidade na igreja permitiu que os abusos fossem escondidos e os predadores beneficiassem desse sistema de proteção.

O tema do livro, adianta Frédéric Martel, não são os casos individuais, mas sim a sociedade íntima dos padres, a sua fragilidade e o seu sofrimento ligado ao celibato forçado.

Não é um julgamento dos homossexuais, sustenta o autor no prólogo, justificando que "gosta bastante deles", mas sim a busca na compreensão do seu segredo e do seu modo de vida coletivo.

"Que fique bem claro que, para mim, um padre ou um cardeal não deve ter a menor vergonha de ser homossexual, penso mesmo que deveria ser um estatuto social possível, entre outros", frisa.

Na opinião do autor, 50 anos depois da revolução gay nos Estados Unidos, o Vaticano é o último bastião a libertar.

"Ao ignorarmos a dimensão largamente homossexual privamo-nos de uma das principais chaves de compreensão da maior parte dos fatos que mancharam a história do Vaticano de há várias décadas a esta parte", explica.

Frédéric Martel refere-se às motivações secretas do papa Paulo VI a confirmar a proibição da contracepção artificial, à obrigação estrita do celibato dos padres a decisão de proibir o preservativo como meio de luta contra a Sida - no momento em que a pandemia ia fazer mais de 38 milhões de mortos -, a demissão de Bento XVI e a guerra atual contra o papa Francisco.

O papa latino-americano foi o primeiro a utilizar a palavra "gay" e não apenas a palavra "homossexual" considerando o autor que é possível assumir que este papa não tem nem as tendências nem a inclinação que foram atribuídas a quatro dos seus predecessores recentes.

É o seu pretenso liberalismo quanto às questões de moral sexual que está na gênese da guerra contra Francisco pelos cardeais conservadores "que são muito homofóbicos", defende.

Mas, segundo Frédéric Martel, Francisco está bem informado: "Os seus assistentes, os seus colaboradores mais próximos, os seus mestres de cerimônias e peritos em liturgia, os seus teólogos e os seus cardeais, onde os gays são também a maioria, sabem que, no Vaticano, a homossexualidade inclui, simultaneamente, muitos dos chamados e muitos dos escolhidos".

Uma obra como estas, defende o autor, dificilmente seria publicável há vinte ou apenas dez anos porque estes caminhos permaneceram no silêncio.

A demissão de Bento Xvi e a vontade de reforma do papa Francisco contribuíram para libertar a palavra.

As redes sociais, a ousadia acrescida da imprensa, e os inúmeros escândalos de "costumes" eclesiásticos tornaram possível e necessários revelar esse segredo.

"Este livro não visa a Igreja em geral, mas um "gênero" particular de comunidade gay, conta a história da componente maijoritária do colégio cardinalício e do Vaticano", adianta.

A história intima desses homens, que projetam uma imagem de piedade, em público, e levam uma outra vida privada, tão diferente entre si, é, segundo o autor, uma meada difícil de desemaranhar.

E o papa Francisco, adianta, sabe que tem de fazer evoluis as posições da igreja e "com o seu ego tranquilo e a sua relação serena com a sexualidade" destoa porque "não é da paróquia".

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