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Cármen Lúcia mandou decisão judicial de soltar Lula ser descumprida, dizem procuradores

Procuradores da Operação Lava Jato teriam discutido como evitar que o petista saísse da prisão por meio de habeas corpus concedido pela Justiça em 2018

Cármen Lúcia mandou decisão judicial de soltar Lula ser descumprida, dizem procuradores
Notícias ao Minuto Brasil

15:00 - 04/03/21 por Folhapress

Política Justiça

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Diálogos enviados pela defesa do ex-presidente Lula ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quinta (4) mostram os procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato discutindo como evitar que o petista saísse da prisão por meio de habeas corpus concedido pela Justiça em 2018.

No dia 8 de julho daquele ano, um domingo, o desembargador Rogério Favreto, do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), atendeu a um pedido de advogados e determinou que Lula fosse solto.

Ele argumentou que o petista, embora condenado a mais de 12 anos de prisão, não tinha os direitos políticos cassados e por isso poderia fazer campanha eleitoral. Estaria ainda sendo submetido a constrangimento ilegal porque sua sentença ainda não tinha transitado em julgado. Favreto estava no plantão naquele dia.

A notícia foi recebida como uma bomba nos meios jurídicos e deu início a uma movimentação intensa dos procuradores e de magistrados para que a liberdade de Lula fosse evitada. Os diálogos revelam os bastidores das iniciativas tomadas por eles.
O desafio, naquele momento, era ganhar tempo até que a ordem de Favreto fosse revertida.

Por isso, a Polícia Federal foi orientada a descumprir a determinação do magistrado, mostram as conversas. E, de fato, a PF não soltou o ex-presidente.

O primeiro a se manifestar contra a soltura foi o então juiz Sergio Moro, que, embora de férias, deu um despacho afirmando que Favreto era autoridade "absolutamente incompetente" para se sobrepor à ordem de prisão, proferida pela 8ª Turma do TRF-4.

O desembargador Favreto derrubou o despacho de Moro e deu uma hora para que sua decisão fosse cumprida pela PF.

O desembargador João Pedro Gebran Neto, que relatava o processo de Lula no TRF-4, teria entrado no circuito para orientar a PF a manter Lula na prisão.

Nos diálogos, analisados pelo perito Cláudio Wagner e enviados ao STF pelo escritório Teixeira Zanin Martins Advogados, o procurador Deltan Dallagnol escreve aos colegas: "Orientação do Gebran è que a PF solte se não vier decisão do presidente do TRF" [a grafia foi mantida na forma original].

Dallagnol afirma ainda que ele mesmo tinha entrado em contato com os policiais: "Pedi pra PF segurar, mas predicávamos deneto dessa 1h ter sinal positivo. Pq eu dizer e nada não muda muito qdo tem ordem judicial".

O procurador ainda afirma que "Moro tb não tem mais o que fazer​ ".

Em seguida, eles discutem pedidos e manifestações que podem apresentar para que Lula siga preso. E reconhecem a dificuldade da situação."Já enfrentamos desembargadores corruptos antes (Lipmann e Direcei). Aqui a questão parece ser ideológicoa", diz o procurador Januario Paludo. "A posição do MPF tem que ficar clara nos autos. Há abuso de autoridade por parte do Desembargador Favareto".

A esperança a partir daquele momento recai sobre o então presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, que poderia suspender a determinação de Favreto. "Por ora temos 30 min para fazer o Lenz se manifestar. Depois sim, dá para ir com tudo!", diz uma procuradora.

A aflição dos integrantes da Lava Jato aumentava: sem uma decisão rápida de Thompson Flores, Lula poderia ser solto, mostram as conversas. "O problema é que Gebran disse pro Valeixo [o então superintendente da Polícia Federal no Paraná, Maurício Valeixo] cumprir a ordem do Favreto se não vier contraordem tempestiva do president​[e]", escreve Deltan Dallagnol.

"Imprime e leva em mãos para o presidente", diz a procuradora Jerusa Viecili. "Ou driblamos isso ou vamos perder", segue Deltan.

Um pouco mais tarde, o procurador Januario Paludo acalma os colegas: "Waleixo [o superintendente da PF, Mauricio Valeixo] ligou. Lenz ligou para ele pedindo para aguardar a decisão dele".
"Valeixo falou com Thompson que mandou não cumprir até ele decidir", diz Deltan. "Isso nos dá mais tempo".

Em seguida, ele afirma que a então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia, teria se envolvido na movimentação. Ela teria telefonado para o então ministro da Segurança, Raul Jungmann, a quem a PF era subordinada, e pedido para Lula não ser solto.

"Carmem Lúcia ligou pra Jungman e mandou não cumprir e teria falado tb com Thompson. Cenário tá bom", escreveu Deltan Dallagnol.

Thompson Flores acabou suspendendo a decisão de Favretoainda naquele domingo. E Lula seguiu preso.

A coluna enviou o trecho do diálogo a Jungmann, que afirmou se tratar de uma "mentira".

"Naquele dia, recebi telefonema da Cármen Lúcia e de várias pessoas que estavam preocupadas com a situação. Mas ela em nenhum momento me pediu absolutamente nada", diz Jungmann.

"Ela é juíza. Ela sabe que eu nada poderia fazer, nem para soltar, nem para manter alguém preso. Seria um crime, seria obstrução de Justiça", segue o ex-ministro.

Ele afirma que vai interpelar Deltan Dallagnol para que o procurador " confirme ou desminta isso".

Jungmann afirma que, no diálogo que manteve naquele dia com Cármen Lúcia, ela apenas manifestou preocupação com decisões desencontradas da Justiça. E disse que divulgaria uma nota.

A ministra de fato divulgou um texto em que afirmava que a Justiça "é impessoal, sendo garantida a todos os brasileiros segurança jurídica, direito de todos. O Poder Judiciário tem ritos e recursos próprios, que devem ser respeitados. A democracia brasileira é segura e os órgãos judiciários competentes de cada região devem atuar para garantir que a resposta judicial seja oferecida com rapidez e sem quebra da hierarquia, mas com rigor absoluto das normas vigentes".

A coluna procurou o gabinete de Cármen Lúcia, que pediu que a demanda fosse enviada por escrito para que a magistrada pudesse se manifestar.

Os procuradores da Lava Jato não reconhecem a autenticidade das conversas. Afirmam que elas foram obtidas por meios criminosos e que podem ser editadas e tiradas de contexto.

Os diálogos aos quais a defesa de Lula teve acesso, e agora entrega ao STF, fazem parte da Operação Spoofing, que investiga a invasão de telefones de autoridades por hackers.

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