PF busca contabilidade de propina de até R$ 250 mil por mês no Rodoanel
O pente-fino começou na semana passada, após operação da PF, e visa as chamadas fichas-razão da obra viária de São Paulo
© Tomaz Silva/Agência Brasil
Política SP
A Polícia Federal vasculha uma pilha de documentos apreendidos em endereços da empreiteira OAS para tentar comprovar uma contabilidade de propina mensal de até R$ 250 mil que, segundo delatores, era paga pela construtora a agentes públicos do governo paulista encarregados do trecho norte do Rodoanel.
O pente-fino começou na semana passada, após operação da PF, e visa as chamadas fichas-razão da obra viária de São Paulo, como são chamados os extratos gerenciais que contêm as receitas e despesas da empreiteira e os custos da construção.
Essas planilhas são apontadas por delatores como prova de que a empreiteira pagava propina mensalmente a funcionários da estatal paulista Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A), responsável pelo projeto durante a gestão Geraldo Alckmin (PSDB).
A investigação de desvios no Rodoanel tem como base as delações de oito ex-executivos que trabalhavam na Controladoria, setor de propinas da empreiteira baiana. Segundo eles, a OAS pagou, de 2013 até os dois primeiros meses de 2014, de R$ 60 mil a R$ 250 mil mensais em suborno para agentes públicos relacionados ao trecho norte da obra.
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Os delatores do setor de propina da empreiteira dizem não saber quem eram os dirigentes da Dersa que recebiam a propina nem qual era a contrapartida para o pagamento. Para isso, segundo eles, é preciso ouvir os diretores da OAS, que ainda não têm delação firmada.
Nas delações, feitas com a Procuradoria-Geral da República e homologadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em julho do ano passado, os ex-executivos do setor de propina da OAS afirmam que todo mês o departamento gerava os valores do caixa dois e entregava o dinheiro em espécie para dois gerentes da construção, que ficavam encarregados de repassar o suborno a outras pessoas.
A cada entrega, dizem os ex-executivos, o valor era contabilizado numa ficha-razão no campo dos custos da obra.
A entrega do dinheiro vivo que seria distribuído pelos gerentes da obra, segundo eles, era feita sempre com autorização de Carlos Henrique Lemos, superintendente da OAS para a região Sul e São Paulo. Ele é apontado como uma das pessoas que poderia esclarecer o destino da propina.
Os delatores também dizem que para gerar o dinheiro da propina do Rodoanel foram forjados contratos com a empresa Legend, do operador Adir Assad, preso na Lava Jato, mas solto desde outubro após celebrar acordo de delação premiada. Assad também é delator e se tornou uma das principais testemunhas dos pagamentos de propina para executivos do Dersa.
A empreiteira, segundo os delatores, também usava contratos falsos com uma empresa chamada Singulare. Nos dois casos, dizem eles, a OAS pagava essas empresas por serviços não prestados -e elas, após emitir notas frias, devolviam o valor em espécie que era usado no pagamento de propina.
O doleiro Alberto Youssef, pivô da Lava Jato e um dos primeiros delatores da operação, também participou da geração de caixa dois para a empresa e mantinha um esquema de entrega de propinas para agentes públicos, segundo eles. Youssef, afirmaram os delatores, tinha um cartão de entrada da empreiteira para não precisar deixar registro na portaria.
O Rodoanel é um anel viário que circunda a cidade de São Paulo conectando com as principais rodovias do estado. O objetivo do projeto é diminuir o congestionamento na cidade reduzindo o fluxo de caminhões, além de ter reflexos diminuindo o consumo de combustíveis e emissão de poluentes.
O projeto inicial do trecho norte do Rodoanel custou R$ 6,5 bilhões e hoje, após atrasos, já consumiu R$ 10 bilhões. Até o momento 83% da obra está concluída e não há previsão de término. A OAS ainda é responsável por parte das obras.
Outras denúncias de corrupção atingiram as obras do Rodoanel. No ano passado, 14 ex-integrantes do governo paulista e da Dersa tornaram-se réus, acusados de participar de um esquema que desviou R$ 625 milhões das obras do trecho norte.
Houve denúncias relacionadas a outros trechos do anel viário. O ex-presidente da OAS Léo Pinheiro entregou à Justiça do Paraná documentos que indicam o pagamento de R$ 17 milhões em propina nas obras do trecho 5 do Rodoanel Sul.
OUTRO LADO
Em nota, a Dersa diz que a nova gestão estatal "apoia toda e qualquer investigação e vai colaborar de forma integral com o Ministério Público para a elucidação de dúvidas buscando sempre o interesse público".
"Desde janeiro deste ano, a Dersa vem buscando aprimorar sua política de compliance, voltado para a ética corporativa pública e a qualidade do trabalho prestado à população."
A assessoria do antigo governo Alckmin não comentou sobre as suspeitas na estatal até a publicação desta reportagem.
Já a OAS disse que, "por meio de sua nova gestão, tem contribuído com as autoridades competentes e com a Justiça, prestando todos os esclarecimentos".
O advogado de Adir Assad, Pedro Bueno de Andrade, disse que os assuntos tratados por seu cliente na colaboração premiada são sigilosos e Assad continua prestando todos os esclarecimentos às autoridades.
José Roberto Leal, que defende Carlos Henrique Lemos, se recusou a falar sobre o assunto.
Alberto Youssef não quis se manifestar. Com informações da Folhapress.