Mãe trans não consegue registrar seu filho biológico em cartório no RS

Para a advogada, o caso mostra o despreparo do Judiciário para lidar com novas famílias e o preconceito da sociedade contra pessoas trans

© PixaBay

Brasil Registro 27/08/18 POR Folhapress

No dia 3 de agosto, quando a professora Ágata Vieira Mostardeiro, 25, pegou o filho Bento no colo, pela primeira vez, ela enfrentou a tremedeira nos braços pelo medo de deixá-lo cair, e o segurou forte. "Não queria mais largar. Tão pequeno e tão lindo. Fiquei boba, sabe?".

PUB

Ter um filho com a designer de moda, Chaiane Cunha, 26, que tivesse o DNA das duas, era um sonho. Ágata, que se identifica como mulher trans há um ano e um mês, esperou a gravidez da namorada ser confirmada para começar o tratamento hormonal de transição de gênero.

+ Jovem que foi arremessada em brinquedo precisou retirar um rim, diz mãe

Assim que viu o resultado positivo, correu para retificar seus documentos a tempo de ter seu nome na certidão do filho. No dia seguinte ao nascimento, ela seguiu para fazer o registro de Bento.

A animação com o que era para ser um dos momentos mais felizes da vida, porém, murchou na mesa da atendente. O cartório não aceitou seu nome como genitora biológica da criança.

"Me orientaram fazer a certidão só em nome da outra mãe e eu ser registrada como mãe socioafetiva. É o que costumam fazer. Mas, eu sou mãe biológica. Bento é meu único filho e acho que será o único filho biológico possível de nós duas", afirma.

"É angustiante, estar num momento feliz e não poder registrá-lo, além de me mencionarem como pai, volta e meia, de uma forma não legítima".

O parto, realizado em Canoas, região metropolitana de Porto Alegre (RS), não foi fácil. Primeiro, o bebê teve de enfrentar cinco dias de UTI para regular a glicose, um reflexo do diabetes gestacional da mãe, que não foi diagnosticado no pré-natal.

Poucos dias depois de ter alta, o bebê voltou a ser internado no hospital para tratar uma infecção urinária. Diagnosticado com infecção sanguínea, ele segue em tratamento médico.

Na terça-feira (21), após semanas à espera de uma resposta da Justiça, Ágata cedeu. Na Declaração de Nascido Vivo, assinada pelo médico que fez o parto, seu nome estava como "companheira" da mãe da criança. Ela aceitou registrar o filho como mãe socioafetiva, para conseguir incluí-lo em seu plano de saúde e trocar de hospital, enquanto Chaiane assinou um documento dizendo que desistia de procurar "pelo pai biológico" da criança.

Um dia antes, respondendo ao parecer do Ministério Público sobre o caso, o Fórum de Canoas condicionou o registro da criança à apresentação de atestado médico afirmando que Ágata não havia alterado seu sexo biológico na época da concepção -ou seja, que teria condições físicas de ser "pai"- e à uma declaração de Chaiane certificando o vínculo biológico do filho com a namorada.

"Vendo do ponto de vista de filha sem o nome do pai no registro, sabendo que essa é uma realidade recorrente, fico indignada. O Bento é de nós duas, é geneticamente das duas. Não faz sentido que só o meu nome conste", diz Chaiane.

No final de junho, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a regulamentação para retificações de nome e sexo em cartórios de todo o país. Sobre filhos, o documento se refere apenas à mudança de documentos já existentes: em caso de retificação do nome de um dos pais, a alteração deve ter concordância do próprio filho e de outro pai. O caso de Ágata é diferente.

"Se o nome já está retificado, a partir do momento da retificação, todos os atos jurídicos que essa pessoa praticar ela vai praticar com esse [novo] nome. Inclusive, o ato de registrar o filho", explica o defensor público Mário Rheingantz.

Em nota, a Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg) alega que o cartório "não se recusou a realizar o registro de nascimento". "A precaução do cartório foi no intuito de evitar prejuízos à família em razão de eventual procedimento incorreto", diz o texto.

Para a advogada Gabriela Souza, que representa Ágata, o caso mostra o despreparo do Judiciário para lidar com novas famílias e o preconceito da sociedade contra pessoas trans.

"O ato de registro civil é um ato unilateral. Se vai um homem cisgênero [que se identifica com o sexo biológico] e hétero registrar a criança, ninguém pede DNA, ninguém pede que a mãe que está no hospital mande declaração por escrito dizendo que transou com esse homem. Acredito que esse caso seja o primeiro do Brasil", afirma.

O próximo passo, diz ela, é entrar com uma ação para constar na certidão de Bento que ele tem duas mães biológicas e reconhecer Ágata como tal. A advogada também planeja entrar com uma representação na OAB, por quebra de direitos, e outra contra o próprio Judiciário. Com informações da Folhapress.

PARTILHE ESTA NOTÍCIA

RECOMENDADOS

fama A Grande Conquista 2 Há 17 Horas

Ex-Polegar pega faca durante discussão e é expulso de reality

politica Arthur Lira Há 18 Horas

Felipe Neto é autuado por injúria em inquérito aberto a pedido de Arthur Lira

mundo Posição de Lótus Há 19 Horas

O misterioso caso da múmia escondida em estátua de Buda

lifestyle Signos Há 20 Horas

Quatro signos que nasceram para serem famosos

fama GISELE-BÜNDCHEN Há 19 Horas

Gisele Bündchen recebe apoio de prefeito após chorar durante abordagem policial nos EUA

brasil Santa Catarina Há 19 Horas

Homem morre após ser atacado por quatro pitbulls em quintal de casa em SC

fama SAMARA-FELIPPO Há 14 Horas

Filha de Samara Felippo é alvo de racismo em escola, diz site

fama Iraque Há 16 Horas

Influencer iraquiana é morta a tiros em Bagdá

brasil MORTE-SP Há 13 Horas

Morte de jovem após deixar sauna gay causa pânico; relembre histórico

economia REINHART-KOSELLECK Há 17 Horas

Quem é o historiador lido por Haddad após bronca de Lula