Somos uma sociedade de "pais helicóptero" que fazem dos filhos reis
"Para seu próprio bem, temos de dizer 'não' às crianças", resume
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Lifestyle Psicólogo
O psicólogo Javier Urra defende que os educadores de hoje tendem a se tornar "pais helicóptero", que supervisionam os filhos de forma constante, superprotegendo as crianças e as fazendo se sentir reis e equivocadas na importância do seu papel.
"Há uma sociedade do medo. São 'pais helicóptero', sempre a supervisionar a criança para que não coma terra, não tropece, não caia. O filho está sempre protegido, sobre mimado e há um momento em que se sente o rei e se equivoca. Ele é tão importante como os outros, mas não mais importante", sintetiza Javier Urra, terapeuta que lança agora em Portugal o livro "O Pequeno Ditador Cresceu", depois de a obra "O Pequeno Ditador" ter atingido a 18.ª edição.
Ao mesmo tempo, a autoridade dos pais se diluiu e faz dissipar regras, critérios e limites, uma realidade visível sobretudo em países desenvolvidos ou ricos.
"Em países como Angola ou o Quénia isto dificilmente se passará, porque não se aceita uma altercação das regras na casa. Aqui, nos nossos países, queremos ganhar o carinho dos filhos, deixamo-nos chantagear por eles. Antes, os pais não tinham tantos livros nem tantas séries de televisão, mas tinham critérios: isto está bem ou isto nesta casa não se passará assim", argumenta Javier Urra, em entrevista à agência Lusa.
As crianças, desde cedo, precisam de limites, caso contrário se tornam neuróticas: "Precisam de um código. Os pais são como uma parede onde chocam. Os adolescentes, sobretudo, precisam de chocar, chocar e ver que o outro não cede".
Há normas ou limites que Javier Urra considera basilares para evitar que a criança sinta que pode se tornar tirana: não permitir que maltrate ou ridicularize outras crianças ou adultos e não ceder a caprichos impróprios para cada idade (seja não querer ir à escola ou pretender fumar com os amigos).
Defende Javier Urra que as crianças precisam, desde cedo, de se habituar a normas básicas, como não estragar coisas ou respeitar hábitos básicos.
"A maioria dos pais diz a uma criança de 13 anos para escovar os dentes umas 12 vezes. Não é preciso dizer muitas vezes. A criança tem de o assumir, de o interiorizar e fazê-lo", exemplificou.
Mesmo que nem sempre seja culpa dos pais, uma criança adquirir o lugar de ditador em casa acontece geralmente porque não são passados critérios de limite ou de autocontrole.
"Aprender a ser um pequeno ditador é muito fácil e é muito cômodo", reforça o terapeuta, lembrando que muitas vezes os pais aceitam o seu papel de escravos.
A este propósito, Javier Urra conta o episódio de um adolescente que entrou no seu centro de tratamento nos arredores de Madrid e que, mal se despia, atirava toda a roupa constantemente para o chão. "Simplesmente porque assim fazia em casa, porque assim fez sempre e nunca fazia de outro modo".
"Há crianças com menos de sete anos que dão pontapés às mães e estas dizem 'isso não se faz' enquanto sorriem", escreve Urra no seu novo livro, enumerando as caraterísticas das crianças com o "síndrome de imperador":
"São crianças caprichosas, sem limites, que dão ordens aos pais, organizam a vida familiar e chantageiam todas aqueles que tentam travá-las".
Para o próprio bem dos filhos, reforça Javier Urra, há que dizer 'não' às crianças, até porque querê-la e amá-la não é dizer 'sim' a tudo.
Não escamoteando que já vivemos numa sociedade em que as crianças não tinham direitos, e em que a educação era autoritária e quase se baseava no medo, o psicólogo espanhol julga que agora, por oposição, se rompeu uma das normas ancestrais da sociedade - o respeito.
Para evitar "não traumatizar", Javier Urra considera que se cede demasiado, que a sociedade está a ser permissiva e a educar os filhos nos seus direitos, mas não nos seus deveres, produzindo filhos tiranos.
"Para seu próprio bem, temos de dizer 'não' às crianças", resume.